Embora os outros autores também lhe nutram a inspiração, a maior fonte é a vida com a sua dor, saudade e emoções. Começou a escrever por gosto e como meio de expressar sentimentos. Incentiva-nos a escrevermos para nós, pois é uma forma de sermos autênticos. Descubram mais sobre o autor Isaac Jaló.
O que lhe deu vontade de escrever livros?
Desde cedo que gostei de escrever, no entanto, a determinada altura, visionei a ideia de poder arquitectar toda uma realidade na qual pudesse expor determinada situação ou sentimento e entendi que seria isso possível através dos livros. O encorajamento para essa visão, surgiu, também, muito através dos conceitos de realização de filmes ou álbuns discográficos.
Onde encontra inspiração?
Embora soe básico e cliché, encontro a inspiração na vida. Na suas diversas circunstâncias e diversos protagonistas. Na dor, na saudade, nas emoções. Nos retratos, nos relatos e noutras obras. Ler outros artistas nutre-me bastante. Mas, sobretudo, encontro inspiração no que vivo ou testemunho.
O que retratam os seus livros?
Por norma, os meus livros retratam flagelos na sociedade que sinto a necessidade ou de expor ou de combater. Principalmente, injustiças sociais sobre comunidades sem voz, ou comunidades cuja voz é, por norma, abafada. Não apenas advogo a seu favor, como também abordo temas que acredito ser necessário, no mínimo, combater e despertar consciências, tentando sempre ter consciência do que escrevo. Por regra, são comunidades nas quais me encontro envolvido, porque é sempre mais complicado falarmos do que não sabemos.
Estas abordagens são sempre realizadas através de uma história de amor. Não necessariamente por ser o que as pessoas mais consomem, mas por ser aquilo que toda a gente sente. E esse é sempre o maior ingrediente, elemento de sensibilização que podemos usar para nos dirigirmos a alguém; o amor.
Hábitos de escrita: Onde escreve? Em que momento do dia? Quanto tempo dedica à escrita?
Escrevo onde dá, mas a principal característica do espaço tem de ser sossego. Sossego em mim, algo que me acalme e que me desperte conforto. O ideal é no interior de um café, sentado à janela ou onde quer que me permita visualizar ambos os lados do espaço. O habitual é no quarto, onde há anos o faço na mesma secretária de sempre, ou, ocasionalmente, na mesinha apertada da cozinha, para não despertar a casa com o taque-taque da máquina de escrever. No entanto, não acredito que o conforto do espaço represente qualidade de produção, pois foi nessa mesma cozinha que, já lá iam duas da manhã, escrevi um dos meus capítulos preferidos do recente livro. Já escrevi nalguns sítios, de praias a cafés de esquina parisienses, mas o lugar mais icónico em que alguma vez me orgulharei de ter escrito, foi sentado ao lado da estátua do Fernando Pessoa numa conversa que só dois loucos poderão compreender.
Quanto à altura do dia, o melhor é quando há calma, mas no meu dia-a-dia a calma não escolhe horas. De preferência, de manhã, porque é quando o sol nasce e o café sabe melhor. Quando os pássaros cantam em correcção do que os galos desafinaram, banda sonora do típico poeta.
Improvisa à medida que escreve ou conhece ou conhece o fim antes de escrever?
Ambos. Na verdade, desenho na cabeça ou no papel o enredo da coisa. No entanto, nada nunca é fixo e, à medida, que vou escrevendo, vou achando detalhes e episódios que encaixam no que tinha delineado. Basicamente, é como se fizesse a lista de compras, mas, uma vez no supermercado, começasse a adicionar o que não constava na lista. Por isso, nunca me levem às compras.
Qual é o seu livro preferido?
É a pergunta mais difícil de sempre. Todos os livros tocam de forma especial, mas talvez “Uma Abelha na Chuva” do Carlos de Oliveira, porque é mel. Na qualidade de romance, é genial, exímio. Lembro-me de tê-lo lido, de querer ler e desejar um dia ser capaz de escrever de forma tão elegante, mas simples como a dele. Grande parte do leitor não-convencional, hoje em dia, quer só saber de leitura processada. Como fast-food da escrita. Contudo, dediquei-me a ser um detalhista, assim como eram os grandes do séculos XX. E não me lembro de alguém que pinte detalhes de forma tão suave, mas colorida, como o Carlos pintou.
Uma breve mensagem de incentivo para quem gosta de escrever.
Ignorem os críticos destrutivos. Escrever e expor é correr riscos e nunca aceitem que quem nunca escreveu vos limite os sonhos. Quem gosta de escrever deve escrever sempre. Em qualquer lugar, a qualquer altura, por qualquer motivo. A escrita não nos permite apenas criar história, serve também como terapia. Por mais ou menos audiência que tenha, que escreva sempre. Haverá sempre alguém que se identificará com as nossas palavras. Mas, sobretudo, devemos sempre escrever para nós e decidir depois se partilhamos ou não com o mundo. É quando escrevemos para nós que conseguimos ser mais autênticos.
Muito obrigada, Isaac!
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Instagram: @1saacjalo
A foto de capa deste artigo é da Laura Chouette no Unsplash.