A nossa autora convidada de hoje sonhou desde cedo em ser escritora. Apesar dos desafios externos e internos, o amor pelas letras falou sempre mais alto. É com esse mesmo amor que hoje vive a escrever. Inspirem-se com a Marta Coelho!
O que lhe deu vontade de escrever livros?
Cresci rodeada de livros e histórias e, desde cedo, soube que gostaria de seguir um caminho em que as letras fizessem parte do meu dia.
Enquanto os meus amigos e colegas sonhavam ser jogadores de futebol, médicos, cientistas ou cantores, eu queria ser escritora. No sétimo ano de escolaridade tive uma professora de Português que, ao saber desta minha vontade, me garantiu que eu não poderia ser escritora, não em Portugal. Ninguém viveria de vender livros e deveria ter um plano b.
Não deixei que essa visão prática mas pouco poética me roubasse o sonho e decidi seguir um caminho que me permitisse escrever diariamente. Escolhi estudar jornalismo desportivo e comecei o curso de Ciências da Comunicação na área de jornalismo. Cedo percebi que a necessidade de relatar factos e a realidade me roubava a liberdade que eu queria ter na minha escrita e, a meio do meu percurso, decidi mudar para a área de Cinema e Televisão.
Fiz um estágio como guionista no final da licenciatura e nunca mais deixei de o ser, o que significa que conto histórias diariamente e é esse o meu ganha pão. Alimentei sempre a vontade de escrever um livro, escrevi, escrevi e escrevi, guardei muitas histórias na gaveta. Acabou por acontecer o convite da editora Clube do Autor a desafiar-me para escrever um livro juvenil e, desde aí, publiquei mais três livros.
Onde encontra inspiração?
A minha inspiração chega-me no contacto com os outros.
Para se escrever bem, para além do domínio da língua, é preciso conhecer o “mundo” e este mundo chega-me através da observação. Uma música, um sorriso, um atraso na chegada a um compromisso, uma tarde de chuva… Em tudo existe uma história, só precisamos de a querer contar.
Tenho um trabalho que me “obriga” a exercitar a inspiração diária e, por isso, o cérebro está ginasticado para deixar entrar as ideias. Naturalmente que nem todas as ideias germinam, muitas ficam apenas semeadas, à espera de um pouco de sol e alguma água, mas a verdade é que a inspiração se trabalha. Ela não chega simplesmente se nos sentarmos ao computador com o cursor a piscar.
É preciso sair, é preciso ler, é preciso estar em contacto, é preciso, acima de tudo, ouvirmos os nossos pensamentos e não sermos demasiado exigentes com eles.
O que retratam os seus livros?
O meu primeiro livro “A ilha das quatro estações” retrata a estadia de quatro jovens numa ilha fictícia onde chegaram pelos mais variados motivos – é uma ilha para jovens com passado dito problemático. Nesta ilha eles terão as ferramentas para ultrapassar os problemas que os fizeram chegar lá, mas é, acima de tudo, uma história sobre coragem, amizade e amor e como estes ingredientes são essenciais para nos conhecermos a nós mesmos e nos ajudarmos e ajudarmos os que nos rodeiam.
Os livros “Conta Comigo” e “Não tenhas medo” surgiram numa parceria com a plataforma Up To Kids e a editora Máquina de Voar e são para o público infantil. São, essencialmente, cartas de amor escritas por uma mãe à sua filha e, por esse motivo, são universais. Qualquer pai ou mãe pode ler os livros aos seus filhos e declarar não só a promessa de que estará ao seu lado aconteça o que acontecer, como também aconselhar os mais pequenos a aceitarem-se como são e a não terem medo de fugirem um pouco à norma e ao que os outros esperam deles.
O meu mais recente livro, editado de forma independente, existe apenas em formato digital, como e-book, tem o título “Todas as minhas palavras são tuas”. Acompanha a personagem principal “Lena” desde os quinze anos até perto da sua morte e trata maioritariamente da dualidade entre amor vs destino. Ao virar as páginas acompanhamos a Lena desde que ela descobre o amor até que tem de se confrontar com a maior perda da sua vida e crescer com ela. No início quis que fosse um livro juvenil, mas o resultado soa-me sempre a algo mais contemporâneo e transversal.
O meu mais recente livro ainda está em fase de ilustração e faz parte de um projecto muito bonito, mas que ainda não posso revelar.
A nota constante na minha escrita é, naturalmente, o amor. O amor incondicional, mas o amor em termos mais gerais.
Hábitos de escrita: Onde escreve? Em que momento do dia? Quanto tempo dedica à escrita?
Escrevo uma média de oito horas por dia para a minha ocupação principal, por isso é necessário encontrar espaços de silêncio em que eu consiga desligar das outras histórias que estou a contar para me focar nas minhas.
O meu primeiro livro foi escrito num espaço de tempo muito curto, para o que habitualmente acontece, cerca de dois meses. Escrevi, em média, dez páginas por dia e consegui fazê-lo porque estava entre projectos e tinha essa disponibilidade. O último livro a ser publicado foi escrito depois desse, aproveitando a disponibilidade e a forma como as histórias estavam a fluir.
Não existe uma fórmula nem um momento ideal para escrever, pelo menos no meu caso. Gosto mais de escrever durante o dia, mas nem sempre é possível. E gosto de escrever em casa, rodeada das minhas coisas, sem me dispersar com o que acontece lá fora. Tem resultado assim, para mim.
Improvisa à medida que escreve ou conhece o fim antes de escrever?
Em ambos os livros que escrevi para um público mais velho, sabia, antes de começar a escrever, onde a história me ia levar.
O caminho para lá chegar foi pensado antes do início do processo da escrita, mas as decisões foram sendo adaptadas no decorrer desta porque as histórias são organismos vivos, têm vontades e temos de saber “ouvi-las”.
Há sempre espaço para improvisação, para deixar que a história respire e sou muito adepta da mudança de caminho quando isso beneficia a história.
Qual é o seu livro preferido?
Para um leitor ávido, como eu, essa é a pergunta da “morte”.
Como escolher entre os livros que nos moldaram não só a forma como vemos o mundo, mas também como passamos a escrevê-lo? É muito difícil e tento não escolher, porque a lista seria infindável… prefiro recomendar livros quando alguém se sente com pouca vontade de ler e aí fazer uma escolha, mais aproximada ao gosto da pessoa em causa.
Uma breve mensagem de incentivo para quem gosta de escrever.
Escrever é um ofício que se desenvolve. É muito importante escrever muito, sempre, seja qual for o género, seja o que for que surge no momento, sem preconceitos e sem exigências que podem “matar” uma história que ainda está a nascer. Considero que nenhum bom escritor o pode ser sem ser também um leitor.
Se um escritor diz que não tem tempo para ler ou não lê muito, desconfio sempre. É indispensável ter-se muitas histórias a viverem dentro de nós para que saibamos dar corpo às que nasceram connosco.
Boas leituras!
Muito obrigada, Marta!
Podem acompanhar o trabalho da Marta no instagram @martacoelho.escreve.
Obrigada ao Markus Winkler no Unsplash pela foto de capa deste artigo.
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