Esta manhã, ao chegar ao trabalho, deparei-me com um grupo de colegas a relembrar, num apurado tom nostálgico, os doces que comiam quando eram crianças. Entre sabores e marcas, o reavivar da memória aconteceu, sobretudo a memória do paladar.
Olhando para trás, para três dezenas de anos atrás pelos menos ( ainda não tenho problemas de vista ao longe), vi a saborosa inconsciência da infância. Se fosse doce era delicioso!
Agora, em idade adulta, o sabor da inconsciência pode tornar-se muito amargo. Aprendemos que nem tudo o que é doce é favorável. Percebemos também que neste breve regresso ao passado, a conversa, aparentemente banal, significa que sentimos profundamente a falta de comer livremente, de saborear sem a frequente pitada de preocupação que se tornou o acompanhamento obrigatório das mais variadas refeições que fazemos ao longo do dia. Recordamos para viver, mas também para perceber o ponto onde chegámos.
E chegámos aqui: a um mundo gastronómico diferente. Muito diferente. Neste canto do mundo onde me encontro, a variedade de alimentos é extensa, mas a qualidade é reduzida. Somos constantemente abordados por demasiadas opiniões sobre a alimentação correta. Vitamina a menos faz mal, vitamina em excesso não faz bem. Se comemos biológico temos de ter cuidado com os pesticidas. Se comemos plástico, parecemos um ecoponto! Uns adoecem por não comer, outros por ingerir alimentos desnutridos.
Olhando para trás, para três dezenas de anos atrás pelos menos, lamento a saborosa inconsciência da infância.
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