Um conto sobre duas colegas, duas dietas e uma só coisa em comum: estarem fartas
O almoço era anunciado, não pelas horas do relógio, mas pelo roncar das barrigas. Às 13h, o escritório era abandonado por todos os que faziam do almoço um momento de prazer improvisado no restaurante mais próximo. Saciavam a fome ao mesmo tempo que emagreciam a carteira. Todos, menos Valentina e Vitória — as duas únicas almas a pensar, na véspera, na refeição do dia seguinte. Quem as convidava engolia em seco perante o gordo “não” que recebia. Proporcionavam jejum à vontade, mas equilibravam o peso da carteira.
Como era costume, partilhavam a mesa de reuniões, mas não a mesma gastronomia.
Valentina, há já dois anos, fizera um workshop de comida vegana e aprendera a comer. Ao mesmo tempo, acrescentara à sua nova rotina o exercício físico diário. Sentia-se muito bem! Energia e leveza eram postas à mesa desde essa mudança. Não só recomendava esta nova alimentação, como acrescentava pimenta à conversa de quem não lhe reconhecesse os benefícios. Ela mudara — e o mundo também tinha de mudar.
Vitória, por sua vez, era amante da comida tradicional portuguesa e nunca sentira necessidade de aprimorar as suas refeições porque, como dizia convicta:
«Alimento-me bem!»
Para ela, um menu sem carne era uma barriga vazia e sem alegria.
Enquanto Valentina desdenhava da alimentação da sua colega, Vitória citava as suas verdades:
«Quem não é para comer, também não é para trabalhar; por isso, mais vale um farto do que dois famintos.»
As refeições esfriavam, enquanto a conversa aquecia.
Empanturradas uma da outra, as duas colegas raramente desfrutavam desses momentos.
Acabavam sempre num molho de brócolos.
Se uma dizia que se sentia saudável porque comia devidamente, a outra afirmava que comia convenientemente — e isso fazia-a sentir-se bem. Valentina falava de qualidade; Vitória referia-se à quantidade.
Faltava-lhes um ingrediente, sim.
Não era tofu nem entrecosto — era tolerância, servida quente. Porque, no fundo, ambas estavam fartas. Não da comida.
Uma da outra.
E talvez, só talvez, o segredo para uma boa refeição não esteja no que se põe no prato — mas em quem se põe à mesa sem querer temperar os outros.